Cuidando da
saúde física



Os pacientes que sobrevivem à sepse e permaneceram internados numa unidade de internação ou de terapia intensiva, muitas vezes requerem cuidados em relação à saúde física.

Sobreviver à sepse é uma vitória e o início de uma jornada para alguns pacientes que sofreram complicações relacionadas tanto à essa condição de saúde, quanto ao tratamento ofertado para retirar o indivíduo do quadro de sepse com por exemplo, antibióticos, corticosteroides e até mesmo a ventilação mecânica. Apesar de benéficos e de salvarem vidas, esses tratamentos podem trazer complicações que prolongam o tempo de reabilitação.

Essa condição, a sepse, é muito rápida. Mas a sua recuperação não é, então os pacientes podem demorar semanas, meses ou até mesmo anos para se restabelecerem e precisarão de um acompanhamento adequado para que a reabilitação ocorra mais rapidamente. Mas o que acontece durante a internação para que surjam essas complicações relacionadas à saúde física?

Durante a internação, o paciente pode perder uma quantidade considerável de massa muscular relacionada a diversos fatores, como por exemplo, a própria sepse que, por ser um processo inflamatório, afeta o sistema neuromuscular. No paciente que permanece acamado por muito tempo, com baixos níveis de atividade física, quanto menos o músculo é utilizado, mais se perde massa muscular. A diminuição da massa muscular promove a perda de força, reduzindo a capacidade do paciente desempenhar atividades do dia a dia (tomar banho, vestir-se, alimentar-se, andar, subir escadas etc.), o que chamamos de perda funcional.

A perda funcional não é incomum nos sobreviventes da sepse, mas a recuperação é possível para a retomada da saúde física. Durante o tempo de limitação das atividades, o paciente pode sentir fadiga, cansaço e falta de ar, gerando desgaste para a realização de atividades que antes eram feitas normalmente, e agora necessitam de auxílio de um cuidador ou familiar. Mesmo com a limitação que na maioria das vezes é temporária, é importante que o paciente não evite a realização das atividades, pedindo ajuda sempre que necessário. Algumas vezes o paciente pode sentir fraqueza nas pernas e não conseguir levantar-se sozinho e, por isso, acaba passando muito tempo na cama. O familiar ou cuidador precisa estar atento, porque permanecer muito tempo deitado pode ser um indício de que o paciente fica muito cansado para desempenhar qualquer atividade ou que não quer pedir ajuda para “não atrapalhar” ou até mesmo que se sente inferiorizado com essa situação limitante. Estimular o paciente a fazer pequenas caminhadas com a ajuda de um auxiliar de marcha (andador) para quebrar o ciclo vicioso de ficar deitado, assim como permanecer a maior parte do tempo em atividade, dentro do possível, ajudará no fortalecimento e, aos poucos, o corpo se acostuma com exercícios e se fortalece.

Nossa dica é que o paciente não deve evitar atividades que tem dificuldades em realizar, mas sim que as realize na medida do possível, pedindo ajuda para o fortalecimento progressivo.

Os pacientes pós-sepse podem apresentar algum acometimento da parte respiratória. A respiração é desempenhada por músculos, podendo gerar fraqueza e sensação de falta de ar durante as atividades, além da tosse ineficaz que é uma tosse fraca e incapaz de “limpar” os pulmões ou a garganta de alguma secreção. Além disso, o retorno ao trabalho, aos estudos e  as atividades de recreação também podem ficar comprometidos logo após a internação.

Metade dos pacientes que sobrevivem a uma internação na UTI não voltam a trabalhar no primeiro ano pós a alta, tamanho o acometimento físico que pode acontecer. Por isso a importância de se entender o processo de reabilitação, para que o paciente retorne o mais rápido possível para suas atividades.

A conscientização dos pacientes, familiares e cuidadores acerca das consequências a longo prazo da sepse se faz muito importante porque, muitas vezes, pensamos que o problema da doença é só durante a internação, e que após a alta o paciente poderá desempenhar as suas atividades na mesma intensidade de antes. Infelizmente não é assim que acontece! Como descrito anteriormente, a doença e o tratamento podem trazer consequências a longo prazo e a melhor maneira de enfrentá-las, é conhecendo-as. Então, se você é um sobrevivente de sepse, familiar ou um cuidador desse paciente, ou se conhece outro paciente com sepse ou outra família lidando com essa situação, mostre os vídeos do nosso site Reabilita Sepse, para que eles possam, de antemão, se preparar para tudo que pode estar por vir.

Outro ponto importante é que o planejamento da alta hospitalar, para a melhor recuperação possível, se inicia durante a internação e não só na hora da alta propriamente dita. No caso da equipe de fisioterapia, como a alta pode ser planejada? Existe uma série de avaliações físicas que podem ser aplicadas aos pacientes, sejam internados na enfermaria ou UTI, para entender quais são os pontos de maior dificuldade, onde houve maior perda de massa muscular, se houve perda força ou de capacidade funcional que irão interferir diretamente na habilidade de realizar as atividades da vida diária. Ainda na UTI, é importante que a fisioterapia, juntamente com a equipe multidisciplinar, mantenha o paciente fora da cama e ativo o maior tempo possível, para evitar perda de massa muscular e diminuir as limitações físicas e respiratórias.

Para alguns pacientes com maior dificuldade de sair da ventilação mecânica, pode haver necessidade de traqueostomia (aquela abertura feita no pescoço, que facilita a respiração) para retirá-lo do respirador e evoluir para a alta hospitalar. Algumas vezes, é possível retirar a traqueostomia ainda durante a internação e há casos em que os pacientes retiram depois da alta hospitalar.

A atuação da fisioterapia nesse cenário é de grande importância para criar condições respiratórias e físicas para retirar o paciente da traqueostomia. Vale lembrar que após a retirada da traqueostomia, pode ficar uma pequena cicatriz no pescoço que em alguns casos some ao longo do tempo ou ficar uma pequena marca.

As avaliações feitas pela fisioterapia facilitam o planejamento do acompanhamento e tratamento após a alta. Esse acompanhamento pode acontecer de maneira ambulatorial (ambulatório do hospital, consultório do médico ou fisioterapeuta) ou domiciliar (com assistência da equipe de saúde no domicílio). Isso dependerá de cada paciente e da equipe de saúde. Quanto antes a reabilitação for iniciada, melhor para a recuperação do paciente.

Um outro ponto relacionado à saúde física que pode ficar comprometido é a questão do sono. Muitos pacientes têm dificuldade com sono já na internação hospitalar e isso pode se estender para alta. O sono é extremamente valoroso para a reabilitação física, juntamente com exercícios para a recuperação da musculatura e uma boa nutrição. Existem algumas estratégias para melhorar a qualidade do sono (chamada higiene do sono):

  • Estabelecer um horário para dormir, ou seja, criar uma rotina de sono;
  • Evitar alimentos estimulantes muito próximo na hora de dormir ou à noite, como energéticos, cafés, alguns tipos de chás;
  • Praticar atividade física durante o dia, pois auxilia na qualidade do sono;
  • Evitar atividades físicas muito intensas próximas da hora de dormir, pois podem atrapalhar o sono;
  • Evitar permanecer na cama durante o dia, para não ter vários cochilos e atrapalhar o sono durante a noite;
  • Tomar sol em horários seguros como início da manhã ou final da tarde, pois o sol é um grande estimulante para corpo e vai ajudar no sono durante a noite;
  • “Mostrar” para o cérebro que está chegando a hora de dormir, diminuindo a luz do ambiente e o som dos aparelhos;
  • Evitar usar telas (celular, tablet ou computador) antes da hora de dormir ou enquanto deitado na cama;
  • Tentar manter um ambiente no quarto mais confortável possível, para facilitar a criação de rituais de relaxamento;
  • Criar um ritual de relaxamento antes de dormir, como tomar um banho morno, toma um chá mais relaxante ou colocar uma música que goste.

Uma outra situação importante e pouco abordada é referente às relações sexuais, pois muitas vezes o paciente retorna para a casa, quer retomar uma vida completamente normal e as relações sexuais fazem parte dessa nossa vida normal. Entretanto, muitos pacientes têm dificuldade em reiniciar esse processo, seja por medo de não ter o mesmo desempenho que antes ou por medo de acontecer algo que ele não saiba muito bem o que é, por estar fraco e não ter mais a mesma capacidade física que antes do evento séptico. É necessário conversar com a equipe de saúde, para entenderem como você está e o que pode ser feito, além de conversar também muito com seu (sua) parceiro (a).

Por fim, por mais que o paciente vá para a casa e ainda esteja fraco, que não consiga andar ou tomar banho sozinho, não se preocupe, isso pode acontecer! O que precisa ser feito é uma boa reabilitação e preparar-se para essa recuperação, que pode ser um pouco mais lenta do que o acometimento sofrido com a doença, mas em breve o paciente estará recuperado e com a qualidade de vida normal ou mais próxima possível.


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Ivens Giacomassi
CREFITO: 3 / 117.813-F

Ivens Giacomassi

Especialista em Fisioterapia em Terapia Intensiva, Especialista em Fisiologia do Exercício, Coordenador do Grupo de Reabilitação Física da BRASPEN, Fisioterapeuta do Hospital Universitário da USP, Docente de Pós-graduação e Palestrante.



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