Alguns pacientes que passam por internação hospitalar prolongada podem limitar-se ou até mesmo perder a capacidade de alimentar-se por via oral (pela boca). Para esses casos, o indivíduo é avaliado, pelo fonoaudiólogo com o diagnóstico de disfagia (dificuldade/impossibilidade de alimentação pela via oral). O paciente passa a receber todo o aporte nutricional por uma via que nós chamamos de via enteral.
A via enteral nada mais é do que a administração dos alimentos convertidos em produtos, na apresentação líquida infundida diretamente no estômago ou no intestino.
A necessidade de terapia nutricional enteral pode ser temporária, com reestabelecimento da função da deglutição, após reabilitação fonoaudiológica. Mas, muitas vezes, esse quadro pode ser definitivo, principalmente naquelas situações em que houve comprometimento de estruturas ou comprometimento neurológico, dificultando a ingestão dos alimentos , além de aumentar o risco de os alimentos descerem para o pulmão, que é a broncoaspiração. Nesses casos, os pacientes saem do hospital com a sonda, inserida pelo nariz chegando até o estômago, o que nós chamamos de sonda nasoenteral. Em outros casos, pode haver necessidade de prolongar essa modalidade de nutrição, optando-se por uma via alternativa em que a sonda é colocada diretamente no estômago, conhecida como gastrostomia. Ainda há casos em que não é possível colocar a sonda para diretamente no estômago, optando-se pela colocação da sonda no próprio intestino, o que chamamos de jejunostomia.
Seja qual for localização desta sonda, nós chamamos todas essas modalidades de terapia nutricional enteral, ou seja, a administração dos nutrientes diretamente no estômago ou no intestino. É importante lembrar que esta terapia garante a oferta de todos os nutrientes necessários para o paciente, como seria atendida por via oral. A diferença é a forma como ela é administrada no organismo.
Esta nutrição colocada diretamente no estômago traz ao paciente a saciedade, a sensação que está alimentado, visto que o indivíduo recebe todos os nutrientes necessários para a manutenção dos órgãos e dos tecidos, garantindo a vida e todo o aporte nutricional para o processo da reabilitação. O processo de reabilitação determina um gasto maior de energia ao organismo para recuperar as funções que foram perdidas ou para amenizar as alterações da composição corporal que aconteceram durante o período de internação como: fraqueza, perda de peso, queda de cabelo, alteração das unhas, desidratação da pele, úlceras por pressão entre outros sintomas.
Os produtos nutricionais são fornecidos pela indústria e garantem a oferta nutricional. É importante lembrar também que esses produtos são considerados de alto custo e, por isso, no momento da alta hospitalar, o paciente deverá ser encaminhado à UBS (unidade básica de saúde) para a solicitação da nutrição enteral à Secretaria do Estado.
Existe uma resolução (Resolução SS-54, de 11-05-2012) que regulamenta o fornecimento para os indivíduos com terapia nutricional enteral. Em negativa a solicitação dos produtos industrializados, eles devem ser orientados a utilizar os produtos que chamamos de nutrição caseira. Através da homogeneização e/ou liquidificação dos alimentos, é possível transformar os alimentos de apresentação sólida em apresentação líquida e, através destas sondas, conseguimos nutrir o paciente.
Assim, a nutrição enteral pode ser classificada de duas formas: nutrição caseira ou nutrição industrializada.
Alguns pacientes podem apresentar a condição que nós chamamos de nutrição mista, ou seja, o fonoaudiólogo já está atuando e prevê a possibilidade de o indivíduo passar a se alimentar só por via oral. Neste caso, associamos a alimentação por via oral e a alimentação por via enteral, até o momento em que entendemos que o indivíduo possa retirar a sonda e seguir se alimentando apenas pela boca. O profissional que vai definir o momento em que a sonda será retirada é o fonoaudiólogo. Desta forma, é possível observar que esse trabalho, tanto de indicação quanto de reabilitação é multiprofissional, porque toda a equipe trabalha de forma integrada buscando um resultado global da saúde.
O suplemento e a terapia nutricional enteral são prescritos por médico e/ou nutricionista.
Esses profissionais têm a competência técnica de dizer qual o melhor produto, quantidade e forma de administração da dieta. É importante ressaltar que essa prescrição é individualizada. Ou seja, mediante características pessoais como: peso, idade, o gasto de energia e proteínas.
De onde vem a importância, após internação prolongada, do paciente ser acompanhado por uma equipe multiprofissional especializada.
Novamente, lembramos que a nutrição enteral pode ser definitiva, quando há a impossibilidade de voltar a se alimentar por via oral, por várias questões clínicas, e pode ser temporária quando ela acontece apenas no período em que o paciente está em reabilitação da deglutição.
A terapia nutricional enteral industrializada, nem sempre acontece com o mesmo produto utilizado durante a internação. Muitas vezes pode ser utilizada uma outra forma de infusão, podemos recorrer ao uso de seringa (ou infusão em bolus), podemos utilizar o método gravitacional (uso de frasco com a dieta conectado a um equipo que se conecta à sonda) permitindo a infusão mais lenta e cotrolada da dieta. Podemos também utilizar bomba infusora para o controle do gotejamento mais apurado.
A forma como a dieta será administrada ao paciente também será prescrita individualmente e baseia-se na condição clínica do indivíduo, para que possamos tornar a terapia domiciliar mais leve e mais adaptada a realidade da família, com liberdade de escolha dos horários e forma da administração.
A prescrição individualizada pelo profissional nutricionista deve englobar: o tipo de produto, a forma de administração, e como vamos inserir isso no contexto familiar, uma vez que a proposta é de reabilitação humanizada, prezando pela qualidade de vida do indivíduo. Respeitando os seus horários, vontades, e toda a disponibilidade daqueles que poderão assistir a esse paciente.
Concluindo, a nutrição enteral é uma prática muito comum após a internação prolongada, é necessária nos casos em que o indivíduo ainda precisa recuperar o estado nutricional ou recuperar a função da deglutição com segurança, previnindo a broncoaspiração pulmonar (pneumonias aspirativas), principal motivo de reinternação após a alta.
Nós, como equipe multiprofissional, trabalhamos em equipe para que todas as variáveis sejam controladas e o paciente possa ser tratado no domicílio de forma segura.
Nutricionista clínica das Unidades de Terapia intensiva do Departamento de Anestesiologia da UNIFESP.
Preceptora da Residência Multiprofissional em Cuidados Intensivos do Adulto – UNIFESP
Doutora em Neurociências pela UNIFESP
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